#015 - Aquele em que as Haim curaram os males do mundo
É incrível como shows mexem com o emocional da gente como quase mais nada no mundo faz. Talvez eu tenha falado um pouco sobre isso nessa outra newsletter, e aparentemente isso está virando um assunto meio recorrente por aqui. Enfim, no último domingo (se você estiver lendo essa edição na semana de sua publicação), mais precisamente dia 4 de junho, fui ao festival Mita, com o intuito de assistir a três bandas, principalmente, Haim, The Mars Volta e Florence + The Machine.
Esses tempos a mulher que eu gosto™ mandou essa mensagem em um grupo de amigos: “Música ao vivo é uma parada muito louca, né? Tu bota uma galera em cima de um palco com uns instrumentos e de repente não há mais tristeza no mundo”. Não é só porque eu gosto dela, mas é por causa de umas sacadas sensacionais assim que eu gosto ainda mais.
No fim, é tão simples quanto está dito, e o show que vi(mos) das irmãs Haim foi exatamente isso. De repente, três irmãs branquelas da Califórnia sobem ao palco usando uma calça de couro preta e um biquíni verde e amarelo, empunham uns instrumentos e fazem a magia acontecer com músicas contagiantes e um carisma inigualável. Elas são os maiores seres humanos que existem, eu tenho certeza disso e posso provar. (Calma, eu sei que estou empolgado, mas elas são sim! rs)
É como se quando elas começassem a tocar imediatamente todos os males do mundo deixassem de existir. Nunca ninguém que as viu foi triste, aposto. Não há mais dor e sofrimento, boletos em atraso e chefes arrombados. A vida é alegre, tá todo mundo na mesma frequência e todas as pessoas ao seu redor viram imediatamente “baixinhos” da Xuxa cantando “Ilariê” alegremente, sem saber muito bem como essa coisa completamente aleatória virou a parada mais legal da última semana. Eu não sei como posso definir melhor o show desse trio do que isso que a mulher que eu gosto™ disse: “de repente não há mais tristeza no mundo”.
Essa newsletter talvez seja um pouco caótica (e qual não é?), mas ela foi também um pouco inspirada pelo que a Anna Vitória Rocha escreveu no Instagram dela falando sobre shows, justamente depois dela também ter testemunhado o furacão Haim que passou pela capital paulista.
A Anna Vitória é dessas cabeças-jovens-pensantes que escrevem e moram na internet que eu gosto muito de ler. Ela comenta aí que andava em crise pelo dinheiro gasto por ela em shows, mas que tudo o que ela sonhava na adolescência era crescer para assistir ao vivo todos os shows que ela só podia ver na TV, e que depois do show das Haim refletiu que “é justamente isso que dá sentido (e força) pra todo o resto, e é legal demais ter virado a pessoa que sempre quis ser”.
Nesse sentido, somos muito parecidos, Anna e eu, porque eu também sempre quis crescer (e ter dinheiro) pra ver ao vivo os shows que via pela TV. E não coincidentemente a vida adulta me proporcionou um pouco mais de liberdade (financeira, principalmente) para realizar alguns sonhos.
Esses dias aí comprei ingressos para os dois shows que o Roger Waters vai fazer em São Paulo no fim do ano. É a terceira vez que o verei, sendo o quarto e quinto shows, mais precisamente, porque vi três antes, em duas outras passagens suas por aqui. E aí me peguei pensando que, no início da minha vida adulta, ainda ganhando muito pouco e tendo que ajudar em casa, não tive dinheiro para comprar ingresso para o show que ele fez aqui tocando o Dark Side of The Moon, do Pink Floyd, na íntegra. Meu álbum favorito.
Isso foi em 2007, e me lembro que contei a um amigo, o Vini, que não iria justamente por não ter grana. Curiosamente, muito próximo da vinda do Roger Waters, também tocaria por aqui o Aerosmith, a primeira banda de rock que gostei, a que fez com que eu me apaixonasse de verdade por música e que já fora a minha banda favorita.
Sabendo disso, e que eu já não tinha comprado ingresso para o Waters, o Vini fez questão de comprar um ingresso pra mim pra esse show, e eu o pagaria quando pudesse. “Você já perdeu o Waters, esse aqui você não vai perder também”. Eu nunca vou me esquecer disso, inclusive porque esse é até hoje um dos grandes momentos da minha vida. Estava vendo a banda que me introduziu a essa paixão pela música, que já tinha sido a minha favorita e com amigos muito importantes pra mim naquele momento. E ter com quem compartilhar esses momentos é sempre mais especial.
Corta para junho de 2023, ainda no Mita, a segunda banda que queria ver era o The Mars Volta. Foi uma banda que descobri há muitos anos por andar ouvindo muito metal progressivo, e que acabava sendo uma indicação meio curinga entre os fãs de prog, porque não era exatamente uma banda super conhecida, mas era muito versátil, mesclando vários gêneros, o que fazia com que acabasse caindo nas graças de quem recebia a indicação.
O show do Mars Volta foi incrível, como eu imaginava que seria, mas me trouxe uma lembrança agridoce (não sou fã do uso de termos em outros idiomas se temos palavras em português que expressam muito bem a mesma coisa, mas bittersweet é uma palavra tão mais bonita que agridoce, né? Tergiverso).
Corta para fevereiro de 2009, Arena Anhembi, show do Kiss. Dessa vez encontrei o Ale, um amigo de Curitiba, e curtimos muito o show. Ao final, nos despedimos, uma vez que ele voltaria para sua cidade com a excursão que tinha vindo, e fui andando sozinho até o metrô Tietê, para ficar no terminal até que desse a hora dele abrir.
Era assim que a gente jovem e sem grana fazia antes do advento do Uber e de um salário minimamente decente. No meio do caminho, coincidentemente, encontrei sem querer um colega de internet, o Guga, que fazia parte de uma ~turminha fã de rock progressivo da qual o próprio Ale também fazia, e fomos conversando até lá, e assim ficamos trocando ideia até a abertura do metrô.
O papo, obviamente, só podia ser música naquele momento. Me lembro da empolgação dele ao me ouvir dizer que gostava de The Mars Volta. Ficamos um tempo falando sobre a banda, mas foi marcante pra mim justamente isso: sua empolgação quando descobriu que mais alguém curtia essa coisa esquisita que ele também gostava muito.
Nunca fomos próximos. Nos encontramos algumas outras poucas vezes, com outros amigos em comum. Não tinha uma única pessoa que não gostava da energia vibrante que ele passava ao falar das coisas que gostava. Lembro que numa outra vez em que nos encontramos para comprar ingressos para um show do Opeth, na Galeria do Rock, ele ficou tão bêbado numa mesa de bar depois com outros amigos que voltamos de metrô e todo mundo foi meio que “cuidando” do Guga pra ele não causar demais, porque ele estava apenas sendo um bêbado feliz, mas um pouco sem noção por conta do grau alcoólico em que se encontrava.
Essas são as minhas poucas lembranças do Guga, que se chamava Daniel. Nunca soube o porquê do apelido. O Guga morreu uns anos depois, ainda muito jovem, com vinte e poucos, de alguma doença ou mal escroto que tira do mundo pessoas legais que um dia se sentaram num banco do Terminal Tietê enquanto falava sobre The Mars Volta.
O Guga não viu o show de domingo, mas de alguma forma ele reviveu na minha memória por alguns instantes, e me ajudou a gritar junto com Cedric Bixler-Zavala as maluquices que ele costuma cantar.
Ainda veria naquele dia a Florência e A Máquina, showzaço. Canta muito. Agita muito. Músicas incríveis. Uma conexão com a plateia como poucos artistas são capazes de fazer. Mas não sei se consigo dizer muito mais. Me emocionei agora escrevendo esse troço.
Gasta seu dinheiro com show, sim! O Guga morreu ontem. A gente morre amanhã. Vive essa merda. É teu sonho, caralho!
Depois de cinco meses sem publicar nada, achei (achamos?) que talvez ficasse mais um tempão sem mandar outra edição, mas do nada me bateu essa vontade de escrever de novo e compartilhar, cinco ou seis dias depois. A vida é inconstante e confusa às vezes. Mas, não posso negar, atualmente ela até que anda boa.
Sigo eternamente nessa crise entre escrever e querer desaparecer todas as vezes em que clico em publicar, mas o retorno de algumas poucas pessoas que ainda leem é sempre reconfortante e animador. "Some things never change, they never fade, it's never over", cantam as irmãs. Não tem como não concordar. Por hoje, é isso!
Um beijo e até a próxima! Viva as Haim!
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