#021 - Ninguém mais me aguenta falando disso
Prometo que esta é a última vez (ou não rs) que uso esse espaço para isso
Cansado. Essa edição já foi rascunhada outras vezes e não fiquei satisfeito em nenhuma delas. Parece que tudo o que quero dizer não faz sentido, soa tudo muito vazio, sinto que ninguém vai se conectar e todo mundo vai pensar “meu deus, que cara chato, ele tá falando tudo isso de novo”. E acho que essa é a sensação que ando tendo com quase tudo também.
O primeiro rascunho dela nasceu em uma madrugada no fim do último mês. Escrevi umas duas dezenas de parágrafos desabafando, e senti que as coisas não se conectavam. Mais uma vez, girava em torno do quanto as redes sociais andam nos fazendo mal e de como acho que a gente deveria mesmo deixá-las, mais uma vez naquela ideia de que a internet é maravilhosa, mas que as redes deram errado, nos adoeceram e blablablá. Eu mesmo confessava um vício crônico nelas, e por isso essa batalha contra os moinhos de vento as redes sociais também era uma forma de me livrar delas, de também me curar. A última edição do ano passado também foi um pouco sobre isso, mais um exemplo de que esse é um dos pensamentos que não me saem da cabeça há tempos.
Alguns amigos às vezes dizem, ironizando: “Você tem usado as redes para pedir para as pessoas pararem de usá-las!”, como se isso fosse um problema. Mas onde mais eu deveria pedir se está todo mundo nelas? Já abandonei praticamente todas, então tenho pensado que o Instagram é minha última trincheira, talvez porque seja a que menos me afete negativamente (uma vez que basicamente 80% do conteúdo que chega até mim mim são animais fofos ou vídeos sobre corrida e exercícios físicos rs), mas também porque é a que talvez as pessoas mais usem, a que ainda tem mais cara de rede social.
O Twitter (em 2024 lê-se xuíter) já morreu e as pessoas seguem lá velando um corpo já apodrecido. O TikTok (que nunca tive) me parece existir menos como rede e mais como um vórtex hipnótico onde quem entra não consegue sair dele por horas (e eu não preciso disso, sei que viciaria). Facebook… bom, alguém ainda usa de fato? Alguém da nossa geração, no caso, da nossa bolha social, do nosso recorte geracional, etc. O resto das redes não importa, tudo irrelevante. Segue o Instagram, que já há muito foi dominado pelos vídeos que só vejo de umas poucas pessoas. O feed mesmo quase não acompanho, e também quase ninguém mais posta fotos, o que é lamentável. Mas as pessoas ainda estão todas lá de alguma forma, “produzindo” ou “consumindo”. Então é lá que de vez em quando vocês ainda me veem, enquanto não consigo me curar completamente desse vício crônico. Por isso faço uso desse espaço às vezes pra dizer: SAIAM DAS REDES!
Já há algum tempo venho falando que queria que internet voltasse a ser um lugar divertido, e que não sei exatamente como ela será, mas que a gente precisa encontrar uma nova lógica para seguir vivendo nela e sendo saudável, uma vez que atualmente não estamos. Daí me deparei com alguns stories da Taize, da Sou Meio Vagabunda, Mas Sou Boa Pessoa, comentando que ela mesma já não tinha mais interesse em “produzir conteúdo” para o Instagram, em fazer dele sua forma de trabalho, uma vez que o algoritmo não ajuda quem precisa dele. Ela pretende focar toda sua produção (voltada mais para o campo da literatura) em sua própria newsletter. Depois, ela acabou escrevendo uma newsletter também falando um pouco mais sobre isso.
Além da Taize, também vi a Jess Correa comentando algo mais ou menos na mesma linha, porque ela não conseguia ter mais tempo nem tanta criatividade pros seus projetos pessoais, a newsletter e o podcast chamados Entre um Chocolatinho e Outro, que já indiquei aqui. Ela não é uma pessoa com grande público nas redes, ao menos não o suficiente para dar uma guinada em sua carreira e se dedicar a eles em tempo integral. Além disso, ela ainda justifica que grande parte de seu esforço criativo acaba sendo gasto nos trabalhos que ela precisa fazer para ganhar dinheiro e pagar as contas, que é meio que o mesmo corre de quase todo mundo que tem seus projetos pessoais na internet.
Quem veio da internet 1.0 como eu, e que sabe o que significa esse termo e o 2.0 –além de saber que nenhum deles mais é usado há quase uma década–, também sabe que ganhar dinheiro na internet nunca foi fácil, não é pra todo mundo e que, embora para algumas pessoas possa ter sido/ser uma realidade, de uma hora pra outra tudo pode mudar e a fonte secar. Ao mesmo tempo, quem tá aqui desde os primórdios também já sabe que as coisas são passageiras, e que a gente segue capinando esse mato enquanto uns e outros desaparecem, e que seguiremos nessa trincheira enquanto nada de mais revolucionário aconteça em nossas vidas.
Em algum lugar dessa newsletter (talvez na página de apresentação), devo ter dito que escrevo na internet já há mais de vinte anos, e que esse número não é fictício. Devo ter começado a blogar (outro termo que ninguém mais usa há pelo menos uma década) lá por 2000, 2001… o que já faz com que mais da metade da minha vida eu exista nessas pradarias. Algumas pessoas tranquilamente me leem há tempo suficiente para terem filhos adultos. Sinceramente, não consigo entender o que faz com que elas continuem, porque acho que nunca contribuí tanto quanto outras pessoas da mesma época, e tantas outras que surgiram nessas mais de duas décadas.
Era tudo mato sim, e quando olho pra trás, por mais que a nostalgia daquela época exista, não deixa de ser melancólico como desde sempre tantos de nós questionávamos a qualidade do que a gente fazia, e como a gente foi tendo que se adequar aos moldes de todas as plataformas, a mudar o nosso tom de voz, a tentar nos encaixar em cada um dos espaços, com cada uma das linguagens, para nos mantermos minimamente relevantes, ainda que fosse para nossa microbolha.
A questão é que acho que nos transformamos tanto nas últimas duas décadas que deixamos de saber quem a gente gostaria de ser, e passamos a ser quem o algoritmo quer que a gente seja. E isso que a gente se tornou não nos fez bem, não faz bem aos outros e, talvez pior de tudo, deu à luz a toda uma nova geração de ~internautas que acha que a internet é só isso aí, que não havia nada diferente antes, então ela talvez sequer consiga vislumbrar a possibilidade de fazer diferente.
Nunca fui “grande” aqui, e também nunca tentei. Sempre fui de matar meus projetos (e redes sociais) porque me canso, porque sinto que eles não geram mais fruto algum, porque penso que não ando contribuindo com mais nada, porque não me acho bom o bastante pra continuar, e porque eles, mas mais especificamente as redes sociais, minam minha saúde mental. Mas de alguma forma sempre volto a escrever e publicar, ainda que divulgue pouco esses escritos.
Nunca deixei de sentir um pouco de vergonha. Talvez eu devesse falar disso na terapia, porque ao mesmo tempo em que rola um medo, rola um reconhecimento de que tá ok ser medíocre. É quase como uma busca por validação ao mesmo tempo em que procuro não chegar a muita gente, porque acho um pouco assustador. É tudo muito conflitante.
Enfim, na newsletter da Taize ela fala de uma outra, da MargeM, que cita o que o escritor Neil Gaiman pensa que pode ser do futuro da internet: uma espécie de volta ao passado, com cada criador tendo seu espaço onde as pessoas vão para lê-las… a era dos blogs de volta, em resumo. Eu não aposto em nada, embora ache que talvez as coisas girem um pouco por aí mesmo. Talvez por estar um pouco mais nessa vibe ultimamente, talvez a era dos blogs da década de 2020 seja a era das newsletters mesmo. Tenho assinado cada vez mais, mas também deixado de assinar outras… há uma certa rotatividade, o que pressupõe uma grande oferta delas.
Mas gosto dessa ideia de que o texto de uma pessoa x, que EU escolhi acompanhar, chega no meu email (que é a melhor coisa criada na internet) e que posso deixá-lo ali guardado para ler quando EU tiver tempo. E posso fazer isso com calma, em silêncio, “secretamente” (embora o dono da newsletter tenha como saber) e sem a necessidade de que o resto da internet saiba o que estou fazendo. Posso interagir de uma forma mais próxima e pessoal com a autora dessa newsletter (faça isso, é gostoso demais!) e sinto que há uma espécie de conexão muito mais forte e verdadeira do que esse contato que a gente tem mantido com as pessoas nas duas últimas décadas pelas várias redes sociais que usamos.
Vocês têm noção que em 2024 faz vinte anos que a gente começou a usar redes sociais? A gente que é velho, no caso. Eu comecei em 2004, lá no Orkut, e sei que algumas pessoas que me leem também estavam lá. Já é tempo mais do que suficiente pra gente repensar no que quer fazer da nossa existência online, certo? Não é possível que essa lógica das redes seja a única que vai prevalecer. A gente é mais criativo do que isso, a gente pode mais, especialmente se a gente se permitir deixar as coisas irem. Let it go, gente. Deu o que tinha que dar. E mesmo que o futuro não seja blog, newsletter ou qualquer outra coisa que a gente já viveu, acho que a gente vai encontrar uma forma de fazer ser divertido novamente.
A internet existia antes das redes sociais, e vai seguir existindo depois delas. Eu já disse isso antes?
O problema é que, quanto mais tempo a gente insistir nelas, mais a gente vai adoecer, mais a gente vai achar que é só isso que existe etc. Já escrevi um monte aqui de novo, mas parece que dessa vez estou menos preocupado em não estar fazendo sentido, e acho que talvez porque eu tenha conseguido moderar a emoção e equilibrar o tom do desabafo. Seguirei escrevendo, algumas poucas pessoas vão seguir me lendo. Às vezes gostando, às vezes não, e isso tudo faz parte. Ainda não sei exatamente os motivos que fazem algumas pessoas me lerem há tanto tempo. Se você estiver aí do outro lado e quiser me responder dizendo por que você ainda continua, eu ficaria muito feliz.
Mas também já aceitei que escrever é o que faço para tirar da cabeça as coisas que já não suporto mais guardar nela. As coisas que me sufocam, que me tiram o norte, que me incomodam, que roubam a atenção que eu poderia dar para outras coisas. Talvez ao longo dessas décadas (meu deus, ainda é estranho falar assim) essa seja uma “assinatura” minha, escrever quase sempre em tom de desabafo. Talvez isso tudo não faça de mim um grande autor, porque não gasto tanto tempo pensando em forma, em estrutura. E eu, que prezo tanto pelo trabalho bem escrito e bem revisado quando leio, não me importo tanto com a forma dos meus escritos desde que eles soem verdadeiros. E quando sinto que eles deixam de ser, simplesmente paro, mato o projeto, seja ele qual for, e espero até que o bichinho da escrita venha me morder novamente e eu volte a enfileirar palavras, geralmente em um espaço novo.
De toda forma, sigo cansado atualmente em relação a quase tudo, mas principalmente em relação a estar em uma situação que não sinto que tenha algo a acrescentar ao mundo, algo a compartilhar com palavras enfileiradas, sabe? E é um pouco frustrante mesmo. Mas eu não sinto vontade de parar agora, pelo contrário, acho que é frustrante também porque eu sigo com vontade, mesmo sem saber exatamente se eu tenho o que dizer e se as pessoas estão interessadas em seja lá o que for que eu diga. Mas também ando interessado em quebrar essa trava, e espero conseguir ainda em 2024 mudar isso.
E aí deixo os questionamentos, que você pode ou não me responder, mas que seria legal você pensar aí do outro lado: o que faz você seguir lendo quem você lê? O que faz do conteúdo que essa pessoa escreve atrativo pra você? O que faz do que ela faz tão único? Talvez tenha algo aí que valha muito mais do que o tempo que a gente gasta nas redes só “vivendo”. E talvez a gente possa usar esse tempo para seguir apreciando o trabalho das pessoas que a gente gosta de acompanhar. Falo isso especialmente porque toda semana a gente vê projetos morrendo porque as pessoas que o fazem não são recompensadas de forma alguma pelo que fazem. Não digo nem financeiramente, porque já aceitamos que isso é raro mesmo e que não vamos todos viver disso. Mas nem com algum retorno da audiência que ela já tem, tenha o tamanho que ela tiver.
Muitas pessoas (eu incluso) gostam silenciosamente do trabalho de muita gente. E, por nos mantermos silenciosos, muitas vezes esses trabalhos morrem porque quem os faz acha que os faz para ninguém, que ninguém se interessa, porque quase ninguém interage, quase ninguém comenta. Enquanto isso, a gente passa horas e horas interagindo, engajando e compartilhando coisas sem qualquer valor, com valor questionável ou claramente lixo tóxico nas redes sociais. E os bilionários donos delas seguem ficando cada vez mais bilionários, enriquecendo às nossas custas e usando de suas riquezas para financiar o mal, enquanto gente que se dedica a fazer as paradas por pura paixão, e com honestidade, vê suas forças minadas e precisa desistir de produzir porque está sendo esmagado pelo capitalismo.
Eu sei que esse papo é chato, eu sei que aí do outro lado você ainda pode achar “meu deus, ele é insistente, ele é repetitivo, e ele mesmo ainda segue usando as redes!”, mas já fiz a minha parcela de autodefesa lá em cima, e também já me assumi tão viciado crônico nas redes quanto você que está me lendo e que talvez nem reconheça os males que ela tem causado na gente individualmente e na nossa sociedade como um todo. Talvez esse seja apenas mais um pedido de socorro meu, um último grito de resistência ou de desistência, em uma das últimas trincheiras que me resta para seguir batalhando. Pensa aí no que faz das pessoas que você gosta de acompanhar na internet especiais. E, se possível, conte pra elas, porque isso pode salvar o projeto da vida de alguém.
E se você aí que é meu amigo (amigo amigo mesmo ou amigo de internet) tem algum projeto e queria que ele fosse mais visto, te dou todo apoio para que você encontre forças pra continuar. E me manda pra eu dar uma olhada também. Não prometo gostar, porque ninguém é obrigado a gostar de nada (e eu sei que deve ter muita gente que gosta de mim e que não se conecta com as coisas que escrevo), e assim é a vida adulta e somos adultos, mas quero ter a chance de dar uma atenção pras suas coisas, pras coisas que são importantes pra você, e que eu tenho certeza que devem valer muito mais do que gastar horas e horas alimentando o grande monstro das redes sociais.
Acho que por hoje é (quase) só. Fique aí com mais uma meia dúzia de palavras sobre algumas outras coisas que não necessariamente se conectam com esse textão.
Um punhadinho de duas ou três coisas
Como faz tempo que não falo aqui sobre as coisas que ando lendo, ouvindo ou assistindo, talvez seja hora de voltar, porque acho que algumas das pessoas que me leem me leem também por esse lado mais de “curadoria”, embora eu não seja curador de nada. Minha primeira leitura do ano foi…
“Flecha”, de Matilde Campilho
Acho que no ano passado (ou será que foi em 2022?) li e me apaixonei por “Jóquei”, seu livro de poemas, que me pareceu muito sensível e bem escrito, e foi uma boa nova reconexão com a poesia, que ando lendo muito pouco recentemente. Então, como quero dar uma atenção maior a isso em 2024, decidi ler o “Flecha”, que ganhei de Natal, acho que esperando mais ou menos a mesma coisa, mas fui surpreendido por um livro totalmente diferente.
Sem saber muito sobre ele, acabei descobrindo que é um livro de prosa, com micro contos e crônicas/cenários escritos por ela, cujos quais me deixaram levemente decepcionado. Não por serem diferentes do que esperava, tampouco por serem em prosa. Ela escreve bem e de uma forma muito bonita ainda assim, isso é inegável, mas durante a maior parte do livro me pareceu que aquelas histórias, contadas entre duas linhas ou duas páginas, muitas vezes prescindiam de mais desenvolvimento. Entendo que a proposta talvez seja também permitir que a gente preencha as lacunas com nossas próprias ideias, mas algumas são tão primitivas em suas premissas que sequer permitem que a gente imagine algo a mais.
Me parece um grande exercício de criatividade da Matilde, que não deixa de ser admirável também, mas em boa parte do tempo gera pouca conexão durante a leitura, diferentemente dos seus belos poemas em “Jóquei”. Não é de forma alguma um livro ruim, acho muito que vale a experiência e que talvez aí funcione melhor do que funcionou aqui, mas sei que ela é capaz de mais, e ainda quero ler mais coisas dela. E sabe o que é mais doido de tudo isso? Escrevendo agora sobre o livro, ainda que pareça que eu esteja falando meio mal, quase sinto que gosto mais agora do que gostei enquanto lia. Ou seja, pode ser dessas obras que vão ficando com a gente por algum tempo e, quando a gente percebe, já está completamente apaixonado mesmo sem ter sentido nada disso no começo. Se eu voltar a pensar nele, conto pra você.
“O Urso”, na Star+
Estou no meio da segunda temporada da famigerada “The Bear”, série da Star+ que todo mundo anda idolatrando como sendo a última bolacha do pacote, e que não há uma única recomendação que não seja seguida de “nossa, que homem gostoso” ou “nossa, com aquele homem horroroso que as pessoas acham gostoso”. Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar, meus amigos.
Definitivamente, é uma série já feita. Ela é boa, bem roteirizada, mas principalmente bem atuada, embora nem isso seja algo assim tão fora da curva na minha humilde opinião de merda. Mas definitivamente é uma boa série de TV. Ao longo dessas duas temporadas a gente vê o cozinheiro Carmy (yes, chef!) assumindo o restaurante do irmão, morto recentemente, e tendo que lidar com todos os problemas que o local tinha, tentando transformar aquela espelunca em um lugar minimamente decente. Paralelamente, ele ganha a ajuda de uma jovem e talentosa cozinheira e empreendedora que é tão ambiciosa quanto Carmy um dia parece ter sido.
Em meio a dramas familiares, uma meia dúzia de personagens levemente irritantes vive seus conflitos pessoais e coletivos enquanto um grito de “yes, chef”, “behind” ou “corner” vai te deixando entre viciado e irritado. É gostosa de assistir, e a maior parte dos episódios dura mais ou menos 30 minutos, então não é um grande esforço como a mais nova temporada de “True Detective”, que tem episódios longos e que não consegui passar do segundo, mas modere suas expectativas a despeito das recomendações apaixonadas das pessoas que são fãs demais da série. O bom é que dá pra curtir sem achar que é a maior invenção do audiovisual desde os irmãos Lumière.
“A Ridícula Ideia de Nunca Mais te Ver”, de Rosa Montero
Comecei a ler esse livro junto do grupo de leitura do projeto Feito por Elas (que originalmente é sobre cinema feito por mulheres). Estou atualmente partindo para a terceira e última parte da meta estabelecida pelo grupo. O livro é uma espécie de ensaio da autora sobre o diário da cientista Marie Curie, no qual ela traça alguns paralelos entre a vida da polonesa e a sua, uma vez que ambas acabaram viúvas e tendo que lidar com seu luto. Na verdade, confesso que pensei que o livro fosse um pouco mais sobre a Rosa e sua história do que é sobre a Marie, que foi uma mulher incrível e o livro nos deixa com vontade de saber mais sobre sua vida. No entanto, alguns dos comentários da autora soam um tanto esquisitos (por falta de palavra melhor), deixam um gosto um pouco amargo na boca, apesar dela demonstrar uma grande admiração pela cientista.
Em várias passagens, a autora parece um pouco anacrônica quando comenta certos acontecimentos da vida da Marie, ora colocando sobre ela uma possível ausência de feminismo de sua parte –uma vez que deixou poucos ou nenhum registro sobre a dificuldade de ser uma cientista mulher entre o fim do século 19 e início do 20–, ora julgando seu comportamento pouco feminino (leitura minha) de mãe e dona de casa, que ficou em segundo plano quando confrontado com a atenção que deu a seus estudos, que renderam não só a descoberta de dois novos elementos químicos, o rádio e o polônio, como deram a ela dois prêmios Nobel, em duas áreas diferentes, física e química.
A impressão que dá em alguns momentos é de que ter sido uma das mentes mais geniais da história, além de literalmente ter minerado pedra com as próprias mãos para descobrir elementos que não só ilustram uma tabela periódica mas que são usados até hoje para salvar vidas, não foi suficiente para que a autora celebrasse a existência de Marie Curie sem apontar dedos para suas falhas humanas. Não que eu ache que a gente simplesmente deva ignorar tais falhas, seja de quem for, mas e não somos todos falhos? E sendo, quantos de nós podemos dizer que fizemos pelo mundo o que fez Marie Curie? Ainda estou para terminar a leitura, mas meu pensamento no momento é: “melhore, Rosa!”.
“Bloco do Eu Sozinho”, episódio do podcast Rádio Novelo Apresenta
O Carnaval rolou no último fim de semana e é impossível passar ileso por ele, ainda que a minha carne não seja de Carnaval, e o meu coração seja igual. Recentemente, comecei a ouvir o podcast Rádio Novelo Apresenta, e um de seus últimos episódios trouxe duas histórias do maior espetáculo da Terra que adorei ouvir. A primeira, Realce, conta a história do surgimento de um tradicional bloco de trio de Salvador, que nasceu após a indignação de algumas pessoas em relação aos critérios de seleção das pessoas que poderiam participar dos blocos na capital baiana. Vale muito a pena ouvir.
Mas a história que mais me chamou atenção nesse episódio foi a segunda, sobre o “Bloco do Eu Sozinho”, não o disco dos “Loser Manos” (rs) mas sobre um jornalista que há pouco mais de 100 anos decidiu que brincaria o Carnaval sozinho pelas ruas do Rio de Janeiro, e fez isso por décadas. A história é incrível, e confesso que não conhecia (apenas o termo). O Rádio Novelo Apresenta tem sido um dos podcasts mais interessantes que tenho acompanhado.
Ainda sobre Carnaval…
A Bela Reis escreveu um texto muito bonito sobre o Carnaval na newsletter Associação dos Sem Carisma, O Maior Espetáculo de Resistência da Terra. Acho que você deveria ler, porque ela dá uma aula sobre a história do carnaval em poucos parágrafos.
“Vale o Escrito”, na Globoplay
É impossível falar sobre o Carnaval e não me lembrar de deixar a recomendação dessa série que assisti há pouco tempo e que conta a história do Jogo do Bicho no Rio de Janeiro. Ao lado da última temporada de “Succession”, da HBO, foi a melhor série que vi em 2023. É maravilhoso como a história da contravenção no Rio é rica em personagens icônicos e em acontecimentos tão trágicos quanto impressionantes. E não tem como contar a história do Jogo do Bicho sem passar pela história do Carnaval no Rio, porque as escolas de samba e a festa, ao longo de muitas décadas, tem sido usadas para limpar a imagem de alguns dos maiores contraventores do país, gente que é tão carismática quanto perigosa. Se você assistiu ou for assistir, volte aqui pra me contar o que achou.
Oi Carlos, tudo bem? Gostei bastante das suas reflexões, elas foram minhas também, em parte. Encerrei um perfil de 15 anos no Twitter e infelizmente perdi contato com muita gente boa de lá, que só tinha perfil ali. Também só me sobrou o instagram e, acredite, a maior parte do tempo que passo lá é só pra consumir receitas, rs. Adoro conteúdo culinário.
Também tenho newsletter e acredito que a gente vai voltar é a escrever mesmo. As pessoas estão cansando e adoecendo desse tipo de conteúdo tão dinâmico e, muitas vezes, sem reflexões críticas. Mas vai levar um tempo e será necessária uma legislação mais eficaz pra gente chegar lá.
Até lá, continue sua campanha pro pessoal largar as redes sociais sim. Eu acho que você está certo. Bora tentar trocar ideias de um jeito mais saudável.
Abraços!
Chegando atrasado no bonde: eu não costumo ser muito early adopter das tecnologias, mas também não costumo sair delas. Minha conta no Orkut foi ativa até a plataforma deixar de existir. Meu Facebook segue lá. Nunca apaguei conta em Twitter ou Instagram, todas são minhas primeiras contas nessas plataformas. O que faço é ir reduzindo o uso conforme cai o interesse. No Facebook isso é muito evidente, devo entrar lá umas 2x por mês só pra ver se alguém me marcou ou algo assim, e saio em 5 minutos.
Então eu sigo nas redes sociais. Numa tentativa de dormir mais cedo e otimizar minha gestão do tempo, reduzi as notificações e coloquei timer e bloqueio pro Twitter e pro Instagram, principalmente. O Insta eu acho que me adaptaria a viver sem numa boa. Só olho umas fotos, uns stories, de um ou outro amigo e um ou outro artista, e é isso. Mas com o Twitter eu tenho uma relação diferente e mais complexa para cortar assim. Já teve a época de muita interação com as pessoas lá, mas isso aí minguou e dá pra fazer em outros lugares. Mas o grande impacto dessa rede na minha vida foi: eu de repente passei a saber das notícias e acontecimentos antes das pessoas "normais". Eu não assisto jornal, não frequento sites de notícias, e se não tivesse Twitter, eu talvez não estivesse indignado com o extermínio dos palestinos, por exemplo. Porque a mídia tradicional segue defendendo Israel, então o pouco de notícias que chegariam a mim teriam esse viés. Eu ainda não sei como substituir isso, pois estar por dentro das coisas (notícias do mundo, lançamentos de Hollywood, tretas do mercado literário, de tudo um pouco) se tornou algo essencial na minha personalidade. Mas espero um dia conseguir.